domingo, 24 de julho de 2011

O Enigma de Kaspar Hauser

Por Fabiana Ratti

O Enigma de Kaspar Hauser, (1975) do diretor Werner Herzog relata a história de Kaspar Hauser, uma criança abandonada na Alemanha Ocidental do século XIX. Kaspar Hauser não fala, apenas diz uma palavra: cavalo. Alimenta-se como um bicho e ao invés de andar, rasteja.

Há um mistério no ar. Mas o que parece é que ele foi abandonado quando criança e ficou sem o convívio com os humanos. Quando encontrado por um homem é trancafiado e amarrado em um porão. Este homem o alimenta e passa a ensinar-lhe algumas palavras. O filme narra a trajetória de Kaspar Hauser na tentativa de passar a ser um humano entre tantos.

Para um olhar de psicanalista, este filme é muito ineteressante. Ele mostra que para o  ser humano ser um ser humano, ele precisa nascer com condições para tal. Porém, o filme demonstra que o ser humano pode ficar na condição de um animal, de um bichinho. Para que o ser se torne um ser humano, não basta sua condição fisiológica para tal. São necessárias as condições psíquicas e sociais.

Para que o humano fique na posição ereta, ande e fale é preciso a identificação com um outro semelhante. Ele precisa do convívio e da imagem como espelho para que suas ações ganhem expressão. Para que o ser se humanize é preciso esforço, aprendizagem e educação. É o convívio com o mundo, são os valores sociais e emocioanis que vão conveccionando e dando forma àquele pedaço de carne que rasteja inerte e rosna quase como um animal.

Trago este filme para debate pois ouço com frequencia, na clínica, frases do tipo: “não vou fazer nada. Nasci assim, sou assim, se quiserem este sou eu.” Isso não é verdade. E este filme confirma esta idéia. Desde a posição ereta até posições mais rebuscadas da condição humana, só foram conseguidas devido a um árduo e constante trabalho.

Lacan diz: “Nada é natural.” O que é natural é a inércia. O natural era a posição de bicho em que se encontrava Kasper Hauser. Nada fazia, nada pensava, nada produzia. Para que ele passasse a andar, comer, falar, ou seja, passasse a ser um ser humano e deixasse a condição de bicho, foi preciso esforço.

O que entendo da frase que aparece no consultório é que, nenhum ser humano gosta de que passem por cima de si, de se anular, para que somente o outro possa existir. Porém, existem cuidados e posições que podem ser tomados para que as pessoas consigam soluções em prol de um grupo, do casal, de um acordo, de um objetivo comum, de uma sociedade, etc. E não, como vem sendo feito muito nesta sociedade: em prol de si, em detrimento do outro ou de muitos, ainda com o argumento de que ‘é natural fazer por si’ e romper todas as leis maiores que imperam na sociedade: civis e amorosas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário