quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Espinho na Roseira


Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão

Pedro Alcântara do Nascimento
Amava Rosa Albuquerque Damião
Pedro Alcântara amava Rosa
Mas a Rosa num amava ele não
Rosa Albuquerque amava Jorge
Amava Jorge Benedito de Jesus
E o Benedito, Benedito Jorge
Amava Lina que é casada com João
E o João, João sem dente
Amava Carla, Carla da cintura fina
E a Carla, linda menina
Amava Antônio Violeiro do Sertão

E o sertão vai virar mar
E o mar vai virar sertão
E o sertão vai virar mar
E o mar vai virar sertão
E o sertão vai virar mar
E o mar vai virar sertão
E o sertão vai virar mar
E o mar vai virar sertão

E o Antônio, Cabra da Peste,
Amava Júlia que era filha de Odete
E a Odete amava Pedro
Que amava Rosa que era prima de Drumond
E o Drumond que era casado
Com Maria, que era filha de Sofia,
Mãe de Onofre e de José
E o José era casado com Nazira,
Que era filha de Jandira,
Concubina de Mane
E o Mane tinha dezessete filho,
Dez home e seis menina
E um que ia se resolver
E o rapaz tava já na adolescência
Tinha brinco na orelha
E salto alto pra crescer

Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
Tem espinho na roseira
Oi cuidado, vai cortar a mão
E o Rodolfo, que já era desquitado
Era homem mal amado
Não queria mais viver
Encontrou Maria Paula de Arruda

Que lhe deu muita ajuda,
Fez seu coração nascer
E são essas histórias de amor
Que acontecem todo dia, sim Senhor

E são essas histórias de amor
Que acontecem todo dia, sim Senhor



Essa música: Espinho na Roseira, escrita por André Abujamra da Banda Karnak,  consegue fazer uma intertextualidade entre vários autores, ou seja, uma conversa entre grandes da música e da literatura.

1 – A Quadrilha – poema de Carlos Drummond de Andrade

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Que inspirou também Chico Buarque com a música Na Flor da idade

2 – O Sertão vai virar mar de Moacyr Scliar, inspirado na saga de Antônio Conselheiro, em Canudos no Sertão Bahiano, uma discussão adolescente da tenra história narrada por Euclides da Cunha em Os Sertões.


Poemas, músicas, romances dialogam...
Essa música, Espinho na Roseira, inspirada em outros autores traz verdades que aparecem no consultório de psicanálise...
Rosas lindas e cheirosas... mas com espinhos... como é fácil sofrer por amor...
O jogo da Quadrilha mostra o desejo sempre em busca de algo novo e diferente que nem sempre é correspondido... que precisa de luta e muita coragem para transformar a realidade vivida... do sertão virar mar ou do mar virar sertão...

Em sua última estrofe Abujamra diz:

E são essas histórias de amor
Que acontecem todo dia, sim Senhor

Quando a pessoa está passando por essa sensação de desilusão amorosa, o quanto ela sente como se fosse apenas ela e que é uma dor que nunca terá fim... então, o tempo vai passando e... um novo amor aparece, um novo encontro e um novo desencontro... Faz parte da vida, das entregas e dos amores...

A questão é não ficar apenas nisso. É fazer vínculos, construir relações sólidas, se dedicar aos amores para ter uma nova realidade.

Mas, Como dizia o poeta, Vinicius de Morais também homenageia esse momento não correspondido que todo ser humano passa e se não passou, terá de passar:

Porque a vida só se dá pra quem se deu, pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu!!

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

A delicadeza do amor e Compramos um zoológico



Por: Fabiana Ratti, psicanalista

Para uma semana da criança chuvosa, nada melhor do que assistir a esses dois belos filmes!

A Delicadeza do amor (2012) tem como atriz principal Audrey Tautou, mais conhecida por sua atuação como Amelie Poulain.  O filme francês, muito bem dirigido por David e Stéphane Foenkinos é um romance com comédia. Não podemos dizer que é uma comédia romântica dessas formatadas em que podemos antecipar todos os passos dos personagens principais na previsibilidade americana. Não. A Delicadeza do amor conta a história de Nathalie, uma mulher que ficou viúva muito cedo e frente à dor, preferiu refugiar-se no trabalho. Após alguns anos de luto, Nathalie começa a se relacionar com uma pessoa inusitada no trabalho, interpretada pelo excelente ator e humorista belga, François Damiens

Do ponto de vista da psicanálise o filme é bem interessante porque uma das questões muito trazidas ao consultório é: ‘o que os outros vão pensar dessa pessoa com quem estou saindo?’ É uma questão importante, pois o namoro não se restringe a quatro paredes. A pessoa tem uma vida familiar, uma vida social, uma vida profissional, uma vida econômica, etc. E é preciso pensar em tudo isso ao se relacionar com uma pessoa. Porém, há uma diferença entre pensar nas características da pessoa e ficar na tentativa de preencher a expectativa do Outro, ficar preso a pré-requisitos que agradem ao Outro, passando por cima de questões sérias e profundas do próprio relacionamento em si.

A Delicadeza do amor consegue discutir esse ponto através de personagens coadjuvantes tornado o filme engraçado e liberando os atores principais para viverem e construírem a relação a dois num tempo e espaço muito particular deles, até o estopim que os deixou ainda mais diante um do outro, precisando cada um tomar uma posição mais definida.    

Podemos dizer que o filme americano, Compramos um zoológico (2011), do diretor Cameron Crowe tem quase a mesma toada. É um filme belo e sensível. Para se ver em família. Assim como em A Delicadeza do amor, o filme começa com o falecimento da esposa de Benjamin Mee (Matt Damon), deixando-o viúvo. Neste caso, com dois filhos: um adolescente e uma menina pequena. Tudo vai mal na vida de Benjamin. O trabalho, a relação com o filho adolescente, a vizinhança. Então resolve mudar de vida e, inusitadamente, compra um zoológico. 

Assim como A Delicadeza do amor, Compramos um zoológico tem um timing excelente. As piadas imprevisíveis e a sequência do filme mostra que o amor ainda existe. Mostra que as pessoas são capazes de respeitar umas as outras e que é preciso um tempo de luto para que as pessoas se despeçam de seus entes queridos para conseguirem se re-conectar com um novo amor e uma nova vida. Filmes tão belos que conseguem tratar a questão do luto com a densidade merecida e com a abertura para que a vida continue e assim, sejam estabelecidas novas ligações após tão grande sofrimento!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Cinquenta tons de cinza – Filosofia na Alcova





Por: Fabiana Ratti, psicanalista 

Cinquenta tons de cinza, trilogia da inglesa E. L. James, retoma livros como: Justine, A Filosofia na Alcova, 120 dia de Sodoma, entre tantos escritos pelo aristocrata francês e escritor libertino Marquês de Sade (1740 – 1814). Assim como a moda, as tendências são cíclicas, causando impacto e furor como se fossem a primeira vez. Na época de Napoleão, esses pensadores que incluíam a sexualidade como forma de sadismo ou masoquismo em sua livre escrita, eram encarcerados, hoje ganham os holofotes de Hollywood e muito dinheiro, algo mudou na sociedade.  

Marquês de Sade, alémda questão sexual era ateu, o que na época era bastante questionável,fazia críticas mordazes à sociedade, utilizava-se do grotesco e do horror para discutir questões morais e filosóficas. Sua obra também gerou filmes e peças teatrais, como as muitas apresentadas pelos Satyros, na Praça Roosevelt em São Paulo. 

Podemos pensar outro exemplo, um fenômeno da década de 1990 que foi a “inteligência emocional”. Todos falavam como uma novidade, livros e livros foram vendidos em profusão, mas não era simplesmente uma renomeação do que Freud havia dito em 1900: Todos temos aparelho psíquico e precisamos saber lidar com ele para agir no mundo, na vida, no trabalho e na família?

Bom, assim, podemos ir de exemplos em exemplos pois a sociedade gosta do ar de novidade com uma pitada do já conhecido. Faz parte. E. L. James discute a questão do sadismo na versão feminina. Como psicanalista, só consigo dizer o quanto a discussão filosófica por traz dos abusos sexuais na obra do Marquês de Sade revolucionou a psicanálise lacaniana. Lacan se deu conta do quanto o ser humano não tem um princípio kantiano, ele não busca um bem comum, um bem universal. Dessa forma, ele não busca um prazer, ele busca algo para além do princípio do prazer. O ser humano tem um desejo bem singular, único e, muitas vezes, se coloca em certas posições frente ao outro, deixando com que o outro o sadomize, colocando-se como vítima, sem se responsabilizar pela posição que ocupa, que seja na vida ou nas relações afetivas e sexuais.

Sexo, entre tantos assuntos é sempre mais efervescente, dá mais polêmica e assim aquece o mercado! Como psicanalista, mesmo sabendo que é algo da condição humana, concordo com Caetano Veloso: porque rimar amor e dor?