segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Thanks for sharing – Terapia do sexo



                                                     Por: Fabiana Ratti, psicanalista lacaniana

Thanks for sharing é uma comédia dramática de 2012, à primeira vista bem simples, com poucas estrelas na qualificação Netflix. Porém, é um retrato muito realista do caos em que está a saúde mental. O filme retrata um grupo anônimo. O mocinho Mark Ruffalo está há 5 anos se controlando para não se masturbar ou para não ter relação sexual promíscua... Ele fica entre os colegas, discute sexo e autocontrole. Porém, em nenhum momento o vemos discutir sonhos, desejos, projetos de vida, relação homem e mulher... Nada. Existe um grande vazio.

O bonito é ver os amigos se ajudarem, dando força uns para os outros e compartilhando suas experiências. Por outro lado, é bem triste ver que esse é o único recurso que eles têm! Apoio. Não existe um profissional que trata. Considerar o aparelha psíquico está a anos luz daquele espaço. Tudo é feito no nível do racional, do controle do comportamento; pensamentos, sentimentos e sonhos estão fora de cogitação. O objetivo é controlar o sintoma, com apoio e métodos de autocontrole. 

Aquilo que a pessoa menos pode fazer (transar, beber, se drogar, comer...) é o que ela mais deve pensar para evitar. Como alguém consegue se recuperar desta maneira?

Naquele espaço, a pessoa não é um sujeito que tem seus sofrimentos e dores singulares e por esta razão transforma esta angústia em sintoma. Não. A pessoa é um alcoólatra anônimo, um neurótico anônimo, um viciado em sexo anônimo. O que importa é ser anônimo. Sua singularidade deve ser sufocada e o que ela precisa se controlar é em não repetir o sintoma. É uma técnica que ofusca a personalidade e foca em não repetir o sintoma. Como não reincidir? O filme mostra que é bem difícil!
Para a psicanálise, o sintoma é apenas a ponta de um grande iceberg. É preciso deixar o sintoma um pouco de lado e discutir todos os outros aspectos do sujeito como: família, amor, estudo, trabalho, vida profissional, vida financeira, sexualidade, esporte, saúde, alimentação, lazer. O sujeito não se restringe ao seu sintoma. Ele é uma gama de possibilidades, qualidades, particularidades. O sintoma é uma forma de paralisar o sujeito e fazer com que ele se volte para si, preste mais atenção porque algo não está indo bem.

O que acontece em AAs é algo sociológico. Troca de experiências, parcerias e até amizades. Algumas vezes funciona porque a pessoa encontra ali um espaço de partilha e incentivo que pode estimular o sujeito a mudar seus hábitos. Porém, tratamento de saúde mental, infelizmente, não acontece em grupo. É preciso um lugar reservado, um espaço para o sujeito levar suas interrogações mais íntimas, suas inseguranças e medos. Para haver tratamento é preciso valorizar o que há de mais singular no sujeito e não ao contrário, o que é universal e comum a outros.


Ao tentar driblar uma compulsão, é preciso que o sujeito, de alguma forma, se vincule à vida. A novos sonhos, projetos, conquistas e realizações. Se o sujeito tem novas realizações, o sintoma vai se desmontando, vai se esfacelando e dando lugar a outras satisfações. Se existe um vazio e nada é colocado no lugar, a compulsão a repetição prevalecerá em busca de míseras satisfações sensoriais... Míseras perto de outras tantas satisfações que o ser humano pode ter através de seu talento, construções e conquistas. 

quinta-feira, 3 de novembro de 2016


Noite de Lançamento do Livro


"Inibição Melancólica" - Fabina Ratti


O lançamento do livro aconteceu em 29 de outubro, às 18h na Editora Zagodoni, São Paulo.

Confira alguns momentos!









quarta-feira, 2 de novembro de 2016



1984 – de George Orwell

Por: Fabiana Ratti, Psicanalista Lacaniana


Livro de leitura obrigatória em muitas faculdades, 1984 é um clássico que merece ser lido. Orwell consegue mostrar o extremo de uma sociedade de controle, um poder supremo, uma situação de constante vigília, inclusive no momento de reprodução e constituição da prole.

Podemos pensar em momentos históricos em que existia esse grau máximo de vigilância, como no tempo de Hitler ou no socialismo em que todos espionavam e delatavam vizinhos e amigos. Também podemos extrapolar para outros períodos históricos, principalmente nossa sociedade atual, com um número cada vez maior de câmaras espalhadas pelas cidades e informações em tempo real. Todos sabem de tudo: “Big Brother is watching you”, dando nome ao nosso atual programa de auditório numa casa em que tudo é filmado, tudo é controlado e espionado, por um líder e por todos em volta.

Que mundo é esse? Seria o nosso? Quais semelhanças e quais diferenças? Seria Orwell um visionário?

Prática e objetivamente falando, se “somos todos olhados”, precisamos nos responsabilizar por nossos atos e pelo que divulgamos. Se existe o furo. O vazio. Ele será preenchido com algo. Comentamos e reclamamos, muitas vezes, do quanto este vazio está sendo preenchido com lixo. Bailes funks, humores grosseiros, programas inúteis e sem conteúdo. Há 15, 20 anos, pouco podíamos fazer. Se quiséssemos escrever algo, publicar, falar; era preciso entrar em contato com um jornal e a chance de ter nosso pensamento publicado era ínfima.

Hoje, temos todos os recursos. Sites, blogs, facebook, youtube. Podemos nos expressar, falar o que queremos, dar aulas. Como tudo tem dois lados, ser olhado pode ser uma fonte de horror e perseguição, uma exposição descabida de nossas vidas particulares, um modo de gerar inveja e competição. Até mesmo uma forma rápida e ágil para assaltantes e traficantes, o comércio de drogas e armas cresceu vertiginosamente, assim como outros comércios. Por outro lado, temos acesso a nossos amigos que não víamos há anos, podemos falar com agilidade com pessoas que não tínhamos acesso e principalmente, ter responsabilidade em ocupar o vazio com o que consideramos importante e útil.

Se o mundo faz avanços e não há como retroceder, não sejamos nostálgicos em relação ao  passado, mas, ao contrário, se “estamos sendo olhados” e se “somos controlados pela mídia e pelos forças de controle”, que saibamos escolher dentre estas forças, quais seremos controlados, e responsáveis com o que publicamos para contribuir para nosso futuro.