segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Mãos Talentosas – E o “olhar da mãe”





Por: Fabiana Ratti, psicanalista
 
Que filme lindo esse! Mãos Talentosas (2009) narra a biografia de Benjamin Solomon Carson médico neurocirurgião estadunidense. Dirigido por Thomas Carter e estrelado por Cuba Gooding e Kimberly Elisa. 

Como psicanalista, penso que o ponto nevrálgico do filme para a psicanálise é o que Lacan nomeia como a importância do “olhar da mãe” para seus filhos. 

Carson era uma criança negra, pobre, gordinha, que ficava assistindo TV e ia mal na escola. Sua mãe trabalhava em lares de família, separada e analfabeta. Esforçava-se ao máximo para dar o melhor aos filhos e não revelava a eles sua parca educação formal.

Carson começou a ir muito mal na escola. Tirava notas zero e era ridicularizado entre os amigos. Sua mãe, em nenhum momento questionou sua inteligência e capacidade. Ela apostou no sujeito que ali existia. Ela apostou em sua inteligência, em seu desejo de querer aprender e crescer. 

É muito bonita a cena em que Carson vai à cerimônia religiosa e começa a brotar nele a capacidade de imaginar e de confeccionar estórias. Ao ver o filme, nos é transmitida a ideia de que é um universo muito pobre cultural e intelectualmente. Apenas programas bobos de humor, nenhum livro ou conversa mais profunda. Nem isso inibe a mãe. Mesmo ela passando por questões e problemas emocionais, ela consegue apostar nos filhos. E nasce em Carson essa vontade de imaginar e de criar. 
Outra cena bem bacana é a que ela desliga a TV e coloca algumas leis na casa. A partir daquele dia os filhos deveriam ir à biblioteca e fazer relatórios dos livros lidos semanalmente. Ela instaura a lei, faz a função paterna. Não vale qualquer coisa. Falar besteiras e assistir bobagens é bem diferente de ler, aprender e se esforçar! 

O filme narra a guinada que o filho dá na escola e na vida. Mostra as dificuldades que passa em razão do racismo, da adolescência e da competição no mercado de trabalho, logicamente numa outra perspectiva após essa guinada. 

O chamado fracasso escolar trás para muitas mães um golpe narcísico. Pela psicanálise sabemos o quanto é difícil e trabalhoso fazer a separação mãe-filho. Se um filho é elogiado uma mãe automaticamente fica com o ego inflado. Quando o filho é questionado, uma dor narcísica preenche o coração da mãe e fica bem complicado para os pais verem aquele sintoma escolar como um enigma, um sinal de alerta, uma cifra a ser decifrada. Algo que fala do sujeito, algo que não está indo bem para o sujeito. Assim, muitos hoje em dia, veem tentando tapar esse enigma com diagnósticos prontos, remédios fortes e a exclusão do sujeito. 

A mãe de Carson conseguiu uma proeza! Em sua simplicidade, ela conseguiu separar-se de seu filho. Conseguiu ver o sujeito. Separado dela. Diferente dela. Sem dores narcísicas pôde dizer simplesmente, estude, faça a sua parte, você é capaz. Como diz Freud, desvencilhada do narcisismo das pequenas diferenças, sem rivalizar, sem pensar no que ela era capaz, apostou: estude e conseguirá. 

Entre tantas cenas maravilhosas temos a última em que Carson consegue, como médico neurocirurgião, com seu talento e empenho, realizar uma outra proeza! Parabéns família Carson vocês trazem um legado para a medicina, assim como para a educação. Crianças, estudem! A vida fica bem mais colorida!