quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Educação




Por: Fabiana Ratti

Educação de Lone Scherfig é um belo filme. É a história de Jenny, uma menina de 16 anos ( Carey Mulligan, 24 anos), inocente e sonhadora. Vive o conflito entre viver uma vida de adulta com viagens, bares, amor e sexo, ou continuar menina em sua vidinha de estudos e bom comportamento para se chegar a uma Universidade. 

 

A princípio, nada de novo em seu enredo, existem tantos filmes semelhantes, é apenas mais um belo filme entre tantos. Porém, ele dá margem a um debate de grande importância na atualidade: onde estão os pais no direcionamento da vida dos filhos?

 

A própria Jenny tem uma frase brilhante aos pais, mais no final do filme em que diz, mais ou menos assim: “ok, eu me iludir, sou uma menina de 16, mas e vocês? Onde estavam?” E, é esta a sensação que passa ao longo do filme. Onde estão os pais? Eles não estão vendo? Não para impedir ou proibir, mas no mínimo, conversar e dialogar a respeito de como Jenny vai levando sua vida.

 

Existe um pacto de silêncio e negação. O aparelho psíquico tem este mecanismo. O sujeito nega o que está vendo por alguma razão particular. No caso, medo de discutir as questões com a filha? Vontade de estar vivendo o que ela estava vivendo? Desejo que a filha casasse logo? Não é possível sabermos ao certo. Em cada caso há uma razão. Mas que houve uma negação e um pacto de silêncio na família, houve.

 

O pai, (Alfred Molina) que parecia tão sério e controlador, sempre caia no ‘blablabla’ de David (Peter Sarsgaard), o conquistador mais velho. A mãe (Cara Seymour) tentava ajudar as saídas da filha sem nem tocar em riscos como a perda do ano letivo, o consumo de drogas ou gravidez.

 

A família contextualizada no filme é de classe média, sem grandes recursos financeiros, porém, muito acesso intelectual. Jenny tem aulas de francês e violoncelo, tem acesso a estudos e bons livros. Ou seja, há uma evidência de que o que está em jogo é o deslumbre, a cegueira do aparelho psíquico e não uma falta de recursos intelectuais e racionais para apreender a situação.  

 

Este é um debate que precisa ser feito na sociedade para o acesso a tratamentos e recursos de saúde mental que, vai para além do acesso a instruções intelectuais. Entre tantos exemplos, podemos escolher um: gravidez na adolescência. As grávidas não tiveram instruções? Nenhuma delas tinha informação a respeito do ato sexual e seus possíveis riscos? Doenças? Gravidez?

 

Concordo que temos questões sociais e educacionais gravíssimas! E que boa parte das doenças e gravidezes indesejadas vem desta esfera. Porém, também sabemos que pessoas que teriam acesso a ótimas informações e recursos contraceptivos deixam de usá-los. Por quê? Precisamos debater mais as questões de saúde mental. O aparelho psíquico é preso pelas garras de seus mecanismos de defesa impedindo a visão. Tanto dos jovens quanto de seus pais, que também, pegos por seus inconscientes, deixam de agir e se posicionar perante seus filhos.

 

E, também, não vamos nos iludir... existe o posicionamento dos pais e a atitude dos filhos.Cada um é sujeito. Cada um decide por si. Mas, como psicanalista, aposto que há uma diferença na escolha dos caminhos da vida quando pessoas importantes do adolescente se posicionam, se autorizam a intervir. Ou, no mínimo, se conseguir que exista diálogo. Como psicanalista, muitas vezes, na clínica, me deparo com a interrogação de Jenny: “onde estavam os pais?”



quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Os Sapatinhos vermelhos

Por: Fabiana Ratti


Retornando de férias com um filme feito há 64 anos... Obras de arte são atemporais! Os Sapatinhos Vermelhos, filme britânico de 1948, dirigido por Michael Powell e Emeric Pressburger  é belissimo! Com cenas de balé maravilhosamente bem feitas e produzidas, que não perdem a conexão com a ligação dramática da obra, unindo a intensidade musical e a mestria dos autores, vale a pena ver e rever.
A narrativa é inspirada no conto de fadas de Hans Christian Andersen, no qual uma menina apaixona-se pelos sapatinhos vermelhos da vitrine e quando os coloca no pé, não consegue parar de dançar. 

Vick Page (Moira Shearer) é uma excelente bailarina que precisa de um produtor, um espaço no tablado para ter seu nome lançado e, busca Terry (Jean Short), hábil e rude produtor renomado. Vick conquista seu espaço entre o corpo de bailado e encena ineditamente: Os Sapatinhos Vermelhos. Terry, em contrapartida faz o clássico pedido: dedicação exclusiva em troca de renome... absolutamente exclusiva, o coração deve estar totalmente dedicado ao balé! E, a partir daí já podemos pensar como se desenrola o filme... o convívio tão grande no teatro, o compositor interessante (Marius Goring), a música, o glamour da companhia, das viagens...

E, escolho este filme pois, além de belo, ele discute um traço muito característico do ser humano: a posse. Esse desespero que bate no ser humano em controlar tudo e todos, ter o poder máximo nas mãos, ser presente em todos os momentos, inclusive nos sentimentos e pensamentos do outro. Controlar o coração.
E, não adianta...  

O coração do outro se conquista... não se controla...

E, tamanha posse, tamanha obsessão, não há como ter uma boa saída.

O filme traz a questão bastante discutida por Freud através da obra de Goethe, poeta alemão, que aborda o Mefistole em Fausto. É esse poder que o diabo tem de dar algo tão precioso e pedir em troca a vida, a alma, o coração do sujeito. Um preço muito alto para um caro desejo. Tudo tem seu preço, mas, acordos dessa natureza, não têm como se sustentar e, mefistole não se dá conta que é ele próprio o destruidor de seu mais caro desejo.
Um grande exercício na vida humana: como não ser Mefistole e como não cair nas garras de um!  



• Direção: Michael Powell e Emeric Pressburger
• Gênero: drama/ romance/ musica
• Origem: Reino Unido