quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Suíte Francesa





Por: Fabiana Ratti, psicanalista lacaniana 

Suíte Francesa (2015) é um drama romântico ambientado na Segunda Guerra Mundial, filmado na França e na Bélgica. O interessante deste drama é que fica muito clara a ação do sujeito individual no meio da massa. Também podemos observar como o ser humano é capaz de brigar por questões mínimas, por “narcisismos das pequenas diferenças”, como diz Freud.

Muitos filmes de guerra retratam esse ponto da participação individual. O sujeito é um simples executor de ordens de pessoas acima, impotente no meio em que vive e nada tem a fazer, ou poderia ter feito de forma diferente, e quem sabe, mudado a história?

Quando ouvimos falar de estórias como a do Sir Nicholas Winton (1), corretor do mercado financeiro que providenciou 8 trens para salvar crianças judias da cidade de Praga durante a Segunda Guerra Mundial; ou quando vemos A lista de Schindler de Spielberg, fica mais evidente a participação efetiva que um sujeito tem em sua sociedade. 

Em Suite Francesa, a situação é patética e por essa razão fica quase cômica, se não fosse trágica. Com a ocupação nazista, numa pequena cidade da Bélgica, as pessoas vivem em situação de tensão e vigília. A escassez de comida aumenta e o clima de guerra vai tomando conta da população, soldados alemães estão por toda a cidade.

Para levar comida para os filhos e a esposa, um colono rouba umas galinhas. O patrão não liga, sabe que a situação está difícil e fala para a esposa sossegar, deixar, não ficar controlando. A esposa não arreda pé e conta uma mentira ao marido dizendo que o ladrão de galinhas tinha a ofendido pessoalmente. Então o marido resolve protege-la. Não deixa barato, defende sua honra e presta queixa ao general.

Na hora de fugir, o ladrão de galinhas mata um soldado alemão. A cidade entre em guerra. Camburões e carros de guerra invadem a cidade. Revistam todas as casa com violência e munidos de todas as armas possíveis. As consequências são nefastas...

Fica assim evidente a participação do sujeito no meio da massa. Uma frase, uma mentira, um situação narcísica, pode trazer muita destruição a todos.

Por outro lado, o filme também mostra a participação oposta. A mocinha, interpretada por Michelle Willians, que a princípio parece inerte e bobinha, também tem uma brilhante participação individual e também prova que é possível se destacar na multidão e deixar sua participação especial.
De uma forma bem sensível, o filme mostra a responsabilidade das ações e das escolhas do sujeito, inclusive, na escolha do amor.  




(1)    http://oglobo.globo.com/sociedade/historia/morre-aos-106-anos-ingles-que-salvou-669-criancas-judias-na-segunda-guerra-16624415


segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Thanks for sharing – Terapia do sexo



                                                     Por: Fabiana Ratti, psicanalista lacaniana

Thanks for sharing é uma comédia dramática de 2012, à primeira vista bem simples, com poucas estrelas na qualificação Netflix. Porém, é um retrato muito realista do caos em que está a saúde mental. O filme retrata um grupo anônimo. O mocinho Mark Ruffalo está há 5 anos se controlando para não se masturbar ou para não ter relação sexual promíscua... Ele fica entre os colegas, discute sexo e autocontrole. Porém, em nenhum momento o vemos discutir sonhos, desejos, projetos de vida, relação homem e mulher... Nada. Existe um grande vazio.

O bonito é ver os amigos se ajudarem, dando força uns para os outros e compartilhando suas experiências. Por outro lado, é bem triste ver que esse é o único recurso que eles têm! Apoio. Não existe um profissional que trata. Considerar o aparelha psíquico está a anos luz daquele espaço. Tudo é feito no nível do racional, do controle do comportamento; pensamentos, sentimentos e sonhos estão fora de cogitação. O objetivo é controlar o sintoma, com apoio e métodos de autocontrole. 

Aquilo que a pessoa menos pode fazer (transar, beber, se drogar, comer...) é o que ela mais deve pensar para evitar. Como alguém consegue se recuperar desta maneira?

Naquele espaço, a pessoa não é um sujeito que tem seus sofrimentos e dores singulares e por esta razão transforma esta angústia em sintoma. Não. A pessoa é um alcoólatra anônimo, um neurótico anônimo, um viciado em sexo anônimo. O que importa é ser anônimo. Sua singularidade deve ser sufocada e o que ela precisa se controlar é em não repetir o sintoma. É uma técnica que ofusca a personalidade e foca em não repetir o sintoma. Como não reincidir? O filme mostra que é bem difícil!
Para a psicanálise, o sintoma é apenas a ponta de um grande iceberg. É preciso deixar o sintoma um pouco de lado e discutir todos os outros aspectos do sujeito como: família, amor, estudo, trabalho, vida profissional, vida financeira, sexualidade, esporte, saúde, alimentação, lazer. O sujeito não se restringe ao seu sintoma. Ele é uma gama de possibilidades, qualidades, particularidades. O sintoma é uma forma de paralisar o sujeito e fazer com que ele se volte para si, preste mais atenção porque algo não está indo bem.

O que acontece em AAs é algo sociológico. Troca de experiências, parcerias e até amizades. Algumas vezes funciona porque a pessoa encontra ali um espaço de partilha e incentivo que pode estimular o sujeito a mudar seus hábitos. Porém, tratamento de saúde mental, infelizmente, não acontece em grupo. É preciso um lugar reservado, um espaço para o sujeito levar suas interrogações mais íntimas, suas inseguranças e medos. Para haver tratamento é preciso valorizar o que há de mais singular no sujeito e não ao contrário, o que é universal e comum a outros.


Ao tentar driblar uma compulsão, é preciso que o sujeito, de alguma forma, se vincule à vida. A novos sonhos, projetos, conquistas e realizações. Se o sujeito tem novas realizações, o sintoma vai se desmontando, vai se esfacelando e dando lugar a outras satisfações. Se existe um vazio e nada é colocado no lugar, a compulsão a repetição prevalecerá em busca de míseras satisfações sensoriais... Míseras perto de outras tantas satisfações que o ser humano pode ter através de seu talento, construções e conquistas. 

quinta-feira, 3 de novembro de 2016


Noite de Lançamento do Livro


"Inibição Melancólica" - Fabina Ratti


O lançamento do livro aconteceu em 29 de outubro, às 18h na Editora Zagodoni, São Paulo.

Confira alguns momentos!









quarta-feira, 2 de novembro de 2016



1984 – de George Orwell

Por: Fabiana Ratti, Psicanalista Lacaniana


Livro de leitura obrigatória em muitas faculdades, 1984 é um clássico que merece ser lido. Orwell consegue mostrar o extremo de uma sociedade de controle, um poder supremo, uma situação de constante vigília, inclusive no momento de reprodução e constituição da prole.

Podemos pensar em momentos históricos em que existia esse grau máximo de vigilância, como no tempo de Hitler ou no socialismo em que todos espionavam e delatavam vizinhos e amigos. Também podemos extrapolar para outros períodos históricos, principalmente nossa sociedade atual, com um número cada vez maior de câmaras espalhadas pelas cidades e informações em tempo real. Todos sabem de tudo: “Big Brother is watching you”, dando nome ao nosso atual programa de auditório numa casa em que tudo é filmado, tudo é controlado e espionado, por um líder e por todos em volta.

Que mundo é esse? Seria o nosso? Quais semelhanças e quais diferenças? Seria Orwell um visionário?

Prática e objetivamente falando, se “somos todos olhados”, precisamos nos responsabilizar por nossos atos e pelo que divulgamos. Se existe o furo. O vazio. Ele será preenchido com algo. Comentamos e reclamamos, muitas vezes, do quanto este vazio está sendo preenchido com lixo. Bailes funks, humores grosseiros, programas inúteis e sem conteúdo. Há 15, 20 anos, pouco podíamos fazer. Se quiséssemos escrever algo, publicar, falar; era preciso entrar em contato com um jornal e a chance de ter nosso pensamento publicado era ínfima.

Hoje, temos todos os recursos. Sites, blogs, facebook, youtube. Podemos nos expressar, falar o que queremos, dar aulas. Como tudo tem dois lados, ser olhado pode ser uma fonte de horror e perseguição, uma exposição descabida de nossas vidas particulares, um modo de gerar inveja e competição. Até mesmo uma forma rápida e ágil para assaltantes e traficantes, o comércio de drogas e armas cresceu vertiginosamente, assim como outros comércios. Por outro lado, temos acesso a nossos amigos que não víamos há anos, podemos falar com agilidade com pessoas que não tínhamos acesso e principalmente, ter responsabilidade em ocupar o vazio com o que consideramos importante e útil.

Se o mundo faz avanços e não há como retroceder, não sejamos nostálgicos em relação ao  passado, mas, ao contrário, se “estamos sendo olhados” e se “somos controlados pela mídia e pelos forças de controle”, que saibamos escolher dentre estas forças, quais seremos controlados, e responsáveis com o que publicamos para contribuir para nosso futuro. 

terça-feira, 18 de outubro de 2016





Show de Andrea Bocelli

Por Fabiana Ratti, Psicanalista Lacaniana


Neste blog falamos pouco sobre música... Precisamos inclui-la mais neste debate... 

Nesta ocasião vamos falar devido a um fato ocorrido nesta última semana no show de Andrea Bocelli aqui em São Paulo. A cantora Paula Fernandes, por algum motivo, não conseguiu continuar cantando. Sua equipe justificou problemas técnicos, não sabemos ao certo. Mas, me fez lembrar o famoso fim de Copa do Mundo na França, em 1998, quando Ronaldinho, o primeiro jogador do mundo, ficou paralisado em campo.

Esses dois casos, sem sombra de dúvidas, me remetem ao texto freudiano Arruinados pelo êxito de 1916, em que Freud se questiona a respeito do motivo pelo qual Lady Macbeth (de Shakespeare) sentiu-se frustrada após o êxito de ter conseguido a coroa. Então Freud diz:
“Parece ainda mais surpreendente, e na realidade atordoante, quando, na qualidade de médico, se faz a descoberta de que as pessoas ocasionalmente adoecem precisamente no momento em que um desejo profundamente enraizado e de há muito alimentado atinge a realização. Então, é como se elas não fossem capazes de tolerar sua felicidade, pois não pode haver dúvida de que existe uma ligação causal entre seu êxito e o fato de adoecerem.” P.357

Ambos, Ronaldinho e Paula Fernandes, seriam consagrados após suas grandes realizações. Porém, algo mais forte do que eles os paralisou. Algo os impediu de pegar a coroa. Se Ronaldinho teve uma convulsão e depois de levado aos médicos, foi liberado para o jogo, até que ponto não podemos pensar que foi uma conversação? Uma descarga absolutamente psíquica da emoção que passava no momento?

A questão aqui não é diagnosticar ou interpretar nossos ídolos, a questão aqui é incluir um pouco mais a saúde mental em nossa sociedade. Quem não erra? Quem não tem um “branco”? Quem não perde a coragem frente a uma situação tão sonhada?

É muito significativo que a mídia utilize palavras como “amarelou”, “mico”, “vexame”. Essas palavras refletem o despreparo de nossa sociedade frente às questões emocionais e a inclusão do inconsciente em nossas vidas. Nossos ídolos são humanos. 

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Lançamento do Livro


Inibição Melancólica - Um estudo psicanalítico sobre a dor de existir

                                                                                                Fabiana Ratti




Veja o vídeo sobre o Livro  "Inibição Melancólica"   



segunda-feira, 12 de setembro de 2016




Billie Holiday

Por: Fabiana Ratti – Psicanalista

A biografia de Billie Holiday, escrita por Sylvia Fol (2011), começa com um show da cantora e compositora de jazz numa casa de espetáculo lotada, e ela se interrogando se o público ainda a amava... Billie Holiday havia passado um tempo na prisão e não sabia se havia sido esquecida por seus fãs.

É um começo de livro emocionante. Sua voz, o público. Nos passa a ideia de que ela poderia ter vivido apenas esse lado de sua vida. Shows, prosperidade financeira, amor do público, crescimento. Porém, não é essa sua história.

Billie Holiday (1915-1959) nasceu Eleonora Fagan Gough na Filadélfia, Estados Unidos. Ela é filha de um músico que deixou a casa quando ela ainda era bebê e sua mãe fazia alguns trabalhos, entre eles o de prostituta e de empregada doméstica. Seus pais eram negros e pobres, sendo ainda adolescentes quando ela nasceu, 15 e 13 anos. Dessa forma, ela era deixada na casa da avó e de parentes para a mãe poder trabalhar. Foi criada muito solta e sentia na pele a rejeição, era tida como um estorvo, apenas a avó materna parece ter tido uma ligação um pouco mais forte com ela. Teve uma vida difícil. Sem um verdadeiro lar ou uma educação voltada para ela, Billie Holiday foi violentada muito jovem e as pessoas a sua volta diziam que ela passou a ser uma adolescente incorrigível. Não ouvia ninguém, fazia o que queria, não dava satisfação, foi para a casa de correção algumas vezes... Nessa toada, entrou no mundo dos bares, da noite e da prostituição muito cedo.

Como psicanalista, penso que sua formação narcísica ficou comprometida, prejudicando sua carreira e sua vida futura. Toda criança, para ter uma integridade narcísica, uma concepção de eu fortemente estabelecida, precisa de um investimento psíquico nela. Do olhar e dos cuidados maternos. Precisa sentir-se amada e desejada, bem vinda ao mundo. Porém, Billie parece ter sentido exatamente o contrário em sua infância. Desprezada e jogada de casa em casa, Billie Holiday sentia a ausência e a falta de cuidados pela sua pessoa. Parece ter sentido que não havia sido bem vinda neste mundo.

Depois, descobriu sua voz, seu potencial e o efeito que causava nas pessoas.  Começou a ver que as pessoas queriam sua presença, pagavam por suas apresentações e emocionavam-se com sua música. Porém, parece que já era tarde. Ela já não acreditava mais que era bem vinda ao mundo.

Quando lemos a biografia, muito bem escrita de Sylvia Fol, temos uma pontinha de esperança: “agora vai”. Agora ela viu que é ótima, terá dinheiro, realização e encontrará bons companheiros, deixará aquela vida antiga de submundo e humilhações. Mas, não é o que acontece. Billie Holiday continua sofrendo as mazelas do submundo e não se dá conta de seu potencial, a ponto de acreditar em si e em uma vida nova.

Do ponto de vista de analista, a razão dela não conseguir passar, de fato, para uma nova vida é porque a construção de seu narcisismo ficou comprometida pelos primeiros anos de infância, então ela não tem narcisismo suficiente para apostar nela, para se posicionar, para acreditar que possa de fato, viver uma nova vida. Além disso, o seu referencial de amor foi construído extremamente ligado à humilhação e ao desprezo, desta forma, nesta nova busca de relacionamentos e oportunidades, ela não consegue deixar seu padrão de relação amorosa. 

Billie Holiday, com tanto talento, não pode usufruir tudo o que podia desse talento.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Mãos Talentosas – E o “olhar da mãe”





Por: Fabiana Ratti, psicanalista
 
Que filme lindo esse! Mãos Talentosas (2009) narra a biografia de Benjamin Solomon Carson médico neurocirurgião estadunidense. Dirigido por Thomas Carter e estrelado por Cuba Gooding e Kimberly Elisa. 

Como psicanalista, penso que o ponto nevrálgico do filme para a psicanálise é o que Lacan nomeia como a importância do “olhar da mãe” para seus filhos. 

Carson era uma criança negra, pobre, gordinha, que ficava assistindo TV e ia mal na escola. Sua mãe trabalhava em lares de família, separada e analfabeta. Esforçava-se ao máximo para dar o melhor aos filhos e não revelava a eles sua parca educação formal.

Carson começou a ir muito mal na escola. Tirava notas zero e era ridicularizado entre os amigos. Sua mãe, em nenhum momento questionou sua inteligência e capacidade. Ela apostou no sujeito que ali existia. Ela apostou em sua inteligência, em seu desejo de querer aprender e crescer. 

É muito bonita a cena em que Carson vai à cerimônia religiosa e começa a brotar nele a capacidade de imaginar e de confeccionar estórias. Ao ver o filme, nos é transmitida a ideia de que é um universo muito pobre cultural e intelectualmente. Apenas programas bobos de humor, nenhum livro ou conversa mais profunda. Nem isso inibe a mãe. Mesmo ela passando por questões e problemas emocionais, ela consegue apostar nos filhos. E nasce em Carson essa vontade de imaginar e de criar. 
Outra cena bem bacana é a que ela desliga a TV e coloca algumas leis na casa. A partir daquele dia os filhos deveriam ir à biblioteca e fazer relatórios dos livros lidos semanalmente. Ela instaura a lei, faz a função paterna. Não vale qualquer coisa. Falar besteiras e assistir bobagens é bem diferente de ler, aprender e se esforçar! 

O filme narra a guinada que o filho dá na escola e na vida. Mostra as dificuldades que passa em razão do racismo, da adolescência e da competição no mercado de trabalho, logicamente numa outra perspectiva após essa guinada. 

O chamado fracasso escolar trás para muitas mães um golpe narcísico. Pela psicanálise sabemos o quanto é difícil e trabalhoso fazer a separação mãe-filho. Se um filho é elogiado uma mãe automaticamente fica com o ego inflado. Quando o filho é questionado, uma dor narcísica preenche o coração da mãe e fica bem complicado para os pais verem aquele sintoma escolar como um enigma, um sinal de alerta, uma cifra a ser decifrada. Algo que fala do sujeito, algo que não está indo bem para o sujeito. Assim, muitos hoje em dia, veem tentando tapar esse enigma com diagnósticos prontos, remédios fortes e a exclusão do sujeito. 

A mãe de Carson conseguiu uma proeza! Em sua simplicidade, ela conseguiu separar-se de seu filho. Conseguiu ver o sujeito. Separado dela. Diferente dela. Sem dores narcísicas pôde dizer simplesmente, estude, faça a sua parte, você é capaz. Como diz Freud, desvencilhada do narcisismo das pequenas diferenças, sem rivalizar, sem pensar no que ela era capaz, apostou: estude e conseguirá. 

Entre tantas cenas maravilhosas temos a última em que Carson consegue, como médico neurocirurgião, com seu talento e empenho, realizar uma outra proeza! Parabéns família Carson vocês trazem um legado para a medicina, assim como para a educação. Crianças, estudem! A vida fica bem mais colorida!

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Sonhos Tropicais






Por: Fabiana Ratti, psicanalista  
Já havia adorado Sonhos Tropicais quando havia sido lançado em 2001 e assisti no cinema. Neste final de semana assisti de novo com minhas filhas. Ele é espetacular. A direção de André Sturm é impecável, os atores são ótimos e os temas abordados de uma riqueza ímpar! 

O filme se passa na virada do século XIX para o século XX, no Rio de Janeiro. São duas estórias paralelas. A primeira narra o retorno de Oswaldo Cruz (Bruno Giordano) para o Brasil após ter passado três anos estudando na França. A segunda é sobre Ester (Carolina Kasting), uma polonesa que veio ao Brasil na promessa de se casar e na verdade foi comprada para trabalhar em um bordel. O filme se baseia no romance homônimo de Moacyr Scliar. 

Foram muitos os tópicos que pude abordar com as minhas filhas. A questão da prostituição, da violência doméstica, das doenças sexualmente transmissíveis. Na mesma linha, pudemos ver os esgotos a céu aberto no Rio de Janeiro, as pessoas morrendo de varíola e febre amarela, a falta de higiene, a dificuldade de saneamento básico. 

Agora, o mais incrível, triste, porém muito atual, foi ver o Rio de Janeiro, naquela época, passando pelos mesmos problemas que passamos hoje, mais de um século depois. O filme mostra Oswaldo Cruz, primeiro médico sanitarista que nós tivemos, batalhando para fazer prevenção de saúde e saneamento básico e o que ele encontra? Boicote político. Ele tenta implementar a obrigatoriedade da vacina, e recebe uma revolta popular, a conhecida “Revolta da Vacina”. Muito por falta de orientação e organização do governo. Na frase dos atores podemos ouvir a frase célebre que hoje ouvimos em nosso país: “Um mosquito destruindo uma nação!”

Naquela época, Varíola e Febre Amarela, hoje H1N1 e mosquito da dengue. Naquela época, o que causava tudo isso eram os esgotos e as sujeiras. Hoje, muitos esgotos continuam a céu aberto. Os cortiços deram espaços a grande favelas. Os interesses políticos continuam predominando sobre o saneamento básico e a atenção primária em saúde. 

André Sturm continue no caminho, você é um excelente diretor. Com assuntos tão sérios e polêmicos, você conseguiu deixar o filme interessante, divertido e agradável de ser visto. Os cortes são feitos nos momentos certos, o timing dos atores, o cenário... Tudo favorece esse maravilhoso e atual filme. Embora, seria bem bacana que um dia, ele deixasse de ser tão atual...