quinta-feira, 10 de maio de 2012

Habemus Papam, de Nanni Moretti (Itália/França, 2011)


 

Por: Fabiana Ratti, psicanalista 

Nanni Moretti, ator e diretor italiano, tem sido conhecido por seus filmes com um toque de documentário numa nova linguagem  cinematográfica. Com humor ácido, discute questões humanas sempre tocando em criticas políticas, religiosas e sociais.

Neste último, Habemus Papam, Nanni Moretti se supera, consegue levar o filme, o tempo todo, no mesmo ritmo cômico, o que não se via nos anteriores, além de manter o questionamento crítico a cada fala e a cada respiração. É preciso ficar atento pois a cada detalhe existem críticas mordazes, principalmente contra o saber absoluto da  Igreja Católica.

Habemus Papam narra a história de um Cardeal (Michel Piccoli) que, eleito Papa, não consegue assumir sua função, nem mesmo apresentar-se ao público. Afinal, qual seria o desejo do Papa? Desta forma, o conclave permanece e ninguém pode sair do Vaticano até que seja feito formalmente o anúncio do Papa eleito. O convívio entre os Cardeais vai mostrando o ócio em que eles vivem, os vícios em remédio, pequenas disputas, as proibições inúteis, a gula, etc.

O Cardeal eleito demonstra sua insatisfação. O desejo de repensar a vida, a responsabilidade de assumir o cargo, o desejo de não continuar a mesmice, de não ter uma vida apenas de formalidades.

Enquanto o Cardeal repensa a vida indo a uma analista, o referendo deixa um pessoa trancada no quarto em que o Papa estaria para ‘representar’ sua permanência no Vaticano e, neste momento temos uma das mais belas cenas, que para mim, faz um pequeno resumo do que Nanni Moretti apresenta no filme.O falso Papa, trancado no quarto, coloca em som bem alto a maravilhosa Mercedes Sosa cantando: “Todo Cambia” e os personagens do filme aparecem todos afetados pela música latina dançando ao belo som de sua voz.   

E, realmente seria de suma importância que tudo mudasse, como uma corrente natural da vida. Quanta mudança a Igreja Católica precisa fazer para acompanhar seus fiéis do século XXI e não viver de imagem, de um semblante, de uma estrutura que está há anos luz da realidade, da vida e do sentimento das pessoas. Como é preciso haver uma mudança em que os psicanalistas não fiquem surdos ao ouvir os pacientes, querendo encontrar e justificar com o que já está estabelecido. Moretti coloca uma cena em que a psicanalista, independentemente do que ela ouve, tudo é ‘déficit de aceitação’. Ou poderia ser qualquer outro nome como ‘déficit de atenção’ muito na moda hoje em dia, ou ‘hiperatividade’, etc. É preciso haver mudanças para acompanhar o mal estar na civilização do século XXI e o personagem de Michel Piccoli representa muito bem essa idéia. Uma pessoa angustiada querendo descobrir qual o seu desejo e não ficar estratificado em protocolos, em obrigações e representações que talvez não sejam o seu desejo.

Tanto o discurso religioso, quanto o discurso psicanalítico precisam sair de protocolos e semblantes que os cegam e os ensurdecem para que, cada um na sua função possam ir mais e mais na direção da sustentação do desejo e dos projetos dos seres humanos.

Afinal, tudo é passível de mudanças...  

http://www.youtube.com/watch?v=g8VqIFSrFUU


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