quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Um método perigoso


Um método perigoso (2012), dirigido por David Cronenberg, discute o nascimento da psicanálise de maneira picante. Apresenta Freud e Jung, suas ideias revolucionárias a respeito do aparelho psíquico e a paixão pelo analista envolvendo a sexualidade. Bem interessante para atrair o público em geral; sexo tem sempre seu apelo no imaginário popular, ótimo para a bilheteria.

Com este apelo, o filme suscitou muitas perguntas a respeito da relação analista-analisante no público leigo. Desta forma, o que posso dizer como psicanalista do século XXI é que o amor continua sendo a ferramenta mais imprescindível para o trabalho do analista. Sem amor, sem afeto, não há como atingir o aparelho emocional do sujeito. Se falarmos apenas de forma racional, não atingimos a estrutura psíquica, não há uma movimentação pulsional do sujeito e não há como haver transformações, mudanças de posições subjetiva frente aos fatos. A análise em si não acontece.
Sexo já é algo bem diferente. O afeto direcionado ao analista, não precisa, de forma alguma, ser vinculado a um desejo sexual. E hoje, no século XXI esta união: sexualidade-amor-de-transferência é algo bem démodé. Já caiu de moda.

O que acontecia no começo do século XX, na época em que Freud estava descobrindo e construindo o método psicanalítico, foi algo bem histórico, datado. Era uma época anterior a todo este movimento revolucionário que pleiteou pelo direito e pela igualdade das mulheres. Ou seja, não havia um círculo social tão extenso onde era possível os homens e mulheres se relacionarem de forma natural. Elas não trabalhavam, saiam pouco de casa, não deveriam ter acesso à sexualidade antes do casamento. Hoje em dia a realidade é bastante diferente. A inserção da mulher no mercado de trabalho, no mundo acadêmico, nos esportes, na vida social, deu possibilidade para que homens e mulheres se encontrassem de uma forma natural e saudável. No século XX, com as redes sociais e os aplicativos, ampliaram exponencialmente as chances de encontro e conquistas. Assim sendo, essa necessidade de sedução que o ser humano tem, não precisa mais ser canalizada para o consultório, para a relação médico-paciente. Ela já tem muita vazão na sociedade, é o que a clínica aponta.

Porém, de certa forma, é uma relação bem delicada e muitas vezes, podemos dizer que continua sendo um “método perigoso”...O aparelho psíquico tem defesas inconscientes para não entrar em contato com situações e sensações emocionais e, por outro lado, o trabalho do analista é exatamente o de driblar e baixar as resistências inconscientes. Quando essas resistências baixam, as emoções transbordam; lembranças, pensamentos e sentimentos guardados com chave de ouro veem à tona e pode ocorrer uma passagem ao ato ou um acting out, situações que saem do campo da linguagem e passam ao ato. Existem manejos, manobras e instrumentos psicanalíticos para lidar com isso e desviar a pulsão para que o sujeito traduza em palavras emoções que estão a tanto tempo guardadas. E assim, dirigir as paixões para pessoas e situações da escolha do sujeito, este é o objetivo do método de forma singular a cada pessoa.  


De: Fabiana Ratti, Psicanalista Lacaniana

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