quarta-feira, 22 de maio de 2019

Divertidamente




Seguindo a linha animação, vamos falar sobre Divertidamente (2015), comédia dramática americana lançado pela Walt Disney Pictures. A trama se passa na mente de Riley, uma menina de 11 anos que sai de Minnesota e muda-se com seus pais para São Francisco, quando seu pai consegue um emprego.
É bem interessante a trama estabelecida entre Alegria, Tristeza, Raiva, Medo e Nojinho, sentimentos personificados que se agitam na mente de Riley com as novas emoções de mudança de cidade, de escola, de amigos, de casa... Para a confecção do filme, os autores e diretores consultaram equipes de psicólogos e neurocientistas criando um excelente retrato do mundo interno, dos conflitos emocionais e brigas internas que acontecem na mente e no coração das pessoas.  

Como psicanalista, o que me pareceu interessante, foi mostrar o quanto é difícil assumir a tristeza. Há
uma expectativa de que a alegria domine. Realmente, é muito bom quando as coisas vão bem e podemos sentir alegria. Porém, a mudança de cidade, o encontro com o novo, estabelecer novas relações; sabemos que são tarefas árduas, principalmente para uma menina de 11 anos. É importante dar vazão à tristeza. É importante que a pessoa chore, que faça uma espécie de luto do que foi vivido e não será mais, do que foi perdido. Novas pessoas e moções virão, porém, é importante que a pessoa entre em contato com a tristeza. Em Luto e Melancolia (1915), Freud escreve que se a pessoa não realizar o luto, chorar, sofrer e se despedir do objeto perdido, essa dor pode virar uma melancolia, trazendo dores e consequências no futuro.

O filme mostra algo bem “moderno” que é um esforço para não dizer que se está triste, para não entrar em contato com o sofrimento, para só sentir prazer.  Esse é um sentimento enganoso. Não adianta ficar tentando driblar o sofrimento. Ele existe. Assim como a alegria, a raiva, o medo, o nojo, ou qualquer outro sentimento. Entrar em contato com o sentimento, nomeá-lo e lidar com ele é a forma mais saudável de enfrentar as situações presentes e se direcionar para as situações futuras. 

Muito interessante também foi ver e entrar no universo de memórias de Riley. O quanto as memórias têm um valor afetivo, como catalogamos segundo uma lei emocional e não racional, o quanto algumas coisas que ‘esquecemos’ no passado podem parecer memórias tão vívidas no presente, como o ‘amigo invisível’ de Riley: Bing Bong.

Divertidamente mostra mecanismos psíquicos de forma alegre e divertida. Também mostra o medo e a esperança da mãe, a raiva e a apreensão do pai, ou seja, outras mentes em conflitos, cada uma atuando ao mesmo tempo numa família... ainda mais quando há mudanças em jogo ... Pessoas interessantes e projetos novos vão aparecer, mas é importante se despedir do antigo e conversar, dialogar.

Ficou parecendo ao espectador que a família quase não havia conversado a respeito da mudança e das perdas. Que existia uma expectativa de que Riley amasse tudo: quarto novo, escola nova e soubesse lidar maravilhosamente com o novo. Quando Riley passa ao ato, toma uma atitude e preocupa os pais, eles conseguem sentar, conversar, ouvir e traduzir em linguagem os medos e as fantasias que estavam rondando em sua mente.

A partir de então, Riley poderia realmente ter uma nova vida.

Por: Fabiana Ratti, psicanalista lacaniana     

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