
É um filme bonito, sensível, com toques de humor,
discute questões profundas de relacionamento e desejo de viver, porém, comete um
erro crasso que o coloca com uma visão anterior a Freud, ele está há pelo menos
100 anos atrás de seu tempo.
Antes de ler à critica assista ao filme pois é
impossível discutir os pontos sem tocar em como o filme termina.
Vamos começar pelas excelentes interpretações. Louise
(Emilia Clarke), uma moça fofa que usa roupas excêntricas e tenta sempre estar
feliz, vive com sua família em uma pequena cidade da Inglaterra. Porém, suas
aptidões, podemos dizer, são o que Fernando Pessoa descreve em A Tabacaria: Não
sou nada/ Nunca serei nada/ Não posso querer ser nada / À parte isso, tenho
todos os sonhos do mundo. Assim, quando sai de seu trabalho e tenta buscar um
novo emprego, sua vida passa a ser difícil.
Por outro lado, temos Will (Sam Claflin), um moço
rico, bonito, que tinha um mundo a seus pés, mas foi avassalado pelo Real sofrendo
um terrível acidente. Ficou tetraplégico, com todas as tristes consequências que
isso implica e, dessa forma, abalando sua estrutura emocional. Assim, ninguém consegue conviver com
ele. Família, amigos ou mesmo acompanhantes.
Então, temos um desafio para Louise. Sem um CV brilhante
exigido no século XXI, acompanhante poderia ser uma excelente saída para Louise
que precisa sobreviver e ajudar a sustentar sua família. Depois de alguma luta,
Louise consegue ultrapassar o desafio como também ter um romance com Will, o
que é esperado mas também não tira o seu charme, principalmente fazendo o contraponto
com seu namorado atleta que tem todas as mobilidades musculares e ósseas
possíveis, mas não tem visão ou um coração tão doce quanto Will passa a
demonstrar.
Ok. Até então temos um filme Hollywoodiano bonito e
com um roteiro esperado.

Em uma situação em que eu atendia uma criança com
câncer em estado terminal (ela veio a falecer 15 dias depois), uma voluntária
chegou para ela para ofertar-lhe coisas prazerosas como doces, balas e passeio.
Ela recusou e disse que queria fazer contas de matemática. A voluntária ficou
escandalizada e disse que ela deveria descansar, que ela não ‘precisava’ fazer
essas coisas, que deveria fazer coisas legais e ela voltou a falar de seu
desejo: quero fazer conta de matemática. Stephen Hawking que o diga!
Então, é muito interessante como a sociedade ainda
não absorveu os conceitos preciosos de Freud. O sujeito é singular. Não é
universal. Ou seja, é legal viajar, passear, festejar. Sim. A maioria das
pessoas gosta. Mas, não é isso que segura o desejo de viver. Não é isso que faz
o sujeito querer continuar vivendo. Se fosse assim, plaboys que vivem de
festas não usariam drogas e sairiam desgovernados atropelando pessoas e
capotando carros, por exemplo.
Ela, na convivência com ele, não apenas passou a
amá-lo como também descobriu algo que ela sabia fazer muito bem. Ela encontrou
um talento. Ela saiu da posição de Álvaro de Campos da Tabacaria: “serei sempre
o que não nasceu para isso/ serei sempre só o que tinha qualidades/ Serei
sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta.” Ela saiu dessa posição e mudou sua posição subjetiva frente à vida.
Ao que parece, a vida dele ficou melhor, sim, sem
dúvida. O amor é um passo? É um grande passo! Mas eles acreditaram que bastava ele receber coisas que o deixaria
feliz e o ligaria à vida. E não basta. E nem sempre é a felicidade que liga o sujeito à vida. O ser humano precisa de outras coisas. Precisa ofertar. Precisa se
sentir útil ao outro, se sentir especial em suas qualidades na ligação com o
outro para ter um propósito de vida e desejar viver.
O filme é bonito mas perde a chance de pensar na
subjetividade singular de cada um que liga o sujeito à vida e impacta o expectador
com a questão de eutanásia e suicídio programado... pena, porque a questão é
anterior a isso.
Por: Fabiana Ratti, psicanalista
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