A Terceira Margem do Rio é um dos contos mais famosos de Guimarães Rosa
publicado em 1962 no livro Primeiras Estórias. Fala sobre um jovem que
decide sair da casa da família e abandona a sociedade para viver numa pequena
canoa num grande rio.
Muitas interpretações e leituras foram feitas a respeito
do crescimento e amadurecimento do jovem. A leitura mais clássica da psicanálise
é que ele retrata o famoso Complexo de Édipo para Freud: a primeira margem
seria a mãe. O conhecido, o que está mais perto e familiar. O amor
incondicional que temos nos laços de sangue e onde aprendemos as primeiras
palavras, os primeiros passos, a construção do sujeito e as ligações de amor. A
segunda margem seria o pai. A lei, as regras que nos fazem entrar no mundo da
cultura. E a terceira margem representaria nossas próprias escolhas. Nossos caminhos.
Mesmo que numa pequena canoa é assim que começamos a vida. Num espaço pequeno e
a vida lá fora parece muito grande, caudalosa, cheia de novas aprendizagens.
O grande diferencial de uma obra de arte é que ela é sempre
contemporânea, atual, se encaixa nos momentos da vida. Agora, na pandemia, nos
deparamos com a solidão, o isolamento de uma canoa. Não sabemos o que o rio nos
reserva... vemos o sol ‘nascer’ e se ‘pôr’ todos os dias... como jamais
havíamos reparado numa cidade grande. A canoa nos levará para uma terceira
margem. Não sabemos o que encontraremos do lado de lá. Entramos na canoa para
sair rapidamente... talvez 15 ou 30 dias... e os dias vão passando, passando.
Entramos com uma idade... e muitos aniversários estão acontecendo. Sairemos da
canoa com outra idade, num outro contexto histórico e político, muitos
ministros terão passado por nós. Por um lado, nada terá acontecido. Apenas
teremos ficado na canoa, no confinamento. Sem festas, bares, encontros sociais.
Por outro, muitas aprendizagens, inúmeras lives, uma nova forma de ver a vida e
o mundo...
E ‘os caminhos não acabam...’
G. Rosa.
Por:
Fabiana Ratti, psicanalista
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