terça-feira, 6 de dezembro de 2011

O Misantropo




Por: Fabiana Ratti 

O Misantropo, peça escrita por Molière (1622 – 1673) dramaturgo francês, ator e encenador. Nesta peça de 1666 Molière descreve um personagem chamado Alceste que, como o próprio nome da peça diz, é um misantropo, uma pessoa que não aguenta conviver em sociedade, que se cansa das outras pessoas e prefere ficar só a ter de se inserir na convivência social. O argumento de Alceste é que as pessoas não são verdadeiras, se preocupam com besteiras e fazem semblantes o tempo todo. Molière, como em sua obra, faz uma crítica à sociedade burguesa que vive de aparências. Mas, além disso, discute como seria a sociedade se fosse montada no ‘faça como quiser’, como bem entender, sem se preocupar uns com os outros, somente com as pulsões instantâneas verdadeiras e efêmeras. Alceste está apaixonado por Celimène, que, paradoxalmente, defende as regras e as boas maneiras para a boa inserção na sociedade. A peça se desenrola no diálogo entre os dois e os amigos articulando esse debate.

E a psicanálise? Qual posição toma?

Freud parte do princípio de que o ser humano nasce um animalzinho, puro instinto, mas logo nos primeiros momentos já se defronta com a cultura: as vestimentas, a linguagem, os horários para dormir, etc. Assim, passa a ter pulsão que é a confluência do instinto biológico, do aparato psíquico e da inserção na cultura. 

Por muito tempo, alguns leitores de Freud, assim como Alceste, interpretavam a cultura como sendo um horror. Algo imperativo, impositivo que fere a liberdade pessoal reprimindo o sujeito e esta seria a causa de traumas, males e doenças. Alguns da sociedade optaram por uma educação liberal, sem muitos limites ou confrontações. Até que ponto, algumas dificuldades sociais que hoje temos com as drogas, com as irresponsabilidades de álcool ao volante ou mesmo da gravidez na adolescência não teriam relação com este tipo de pensamento?

Em “Mal-estar na civilização” (1920) Freud coloca o quanto existe um mal estar para viver em sociedade, pois não podemos, o tempo todo, falar e fazer o que queremos e como queremos porque existe a liberdade do outro, a privacidade do outro, as leis e as regras para o bom convívio na sociedade.

Lacan defende a idéia de ‘laço social’, um ser humano capaz de fazer laços sociais das mais diferentes formas: entre amigos, colegas, amores, família, é um sujeito que tem maior possibilidade de sorver a vida. Não precisamos ser hipócrita como Alceste condena, mas não é por isso que deixamos de cumprimentar com educação pessoas que não amamos. Existem formas de falar e construir relações sem cair na hipocrisia ou na solidão da ingênua ‘sinceridade’.

Molière, gênio da comédia, mesmo escrevendo em 1666 é, como toda boa obra de arte, sempre uma discussão atual!   



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