sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Edward - mãos de tesoura - O surrealismo fantástico de Tim Burton e a saúde mental

 


Nesta passagem de ano assistimos em casa Edward mãos de tesoura  - filme de 1990 – clássico de Tim Burton com os excelentes atores Johnny Depp, Winoma Ryder, Dianne Wiest. Surrealismo crítico da sociedade. A começar pela vendedora de Avon que batia de porta em porta, um clássico dos anos 1980/90. Por um lado, uma chata que ficava atrapalhando, por outro, temos o crescimento de empresas como Avon e Natura que mostram a eficiência de sua estratégia de marketing.

Em seguida, Tim Burton faz uma crítica à sociedade do século XX em que os maridos saiam para trabalhar e as mulheres ficavam em casa de forma fútil: fofocando, pensando na estética, paquerando os moços que estavam trabalhando.

E nisto, a batalhadora vendedora de Avon toma uma atitude de coragem e vai até o castelo mal-assombrado da vila de moradores. Tim Burton sempre toca em um tópico muito caro aos analistas: o quanto a diferença pode dizer muito mais sobre um potencial do sujeito, do que uma aberração, como a sociedade costuma ver.

Em Psicologia das massas e análise do ego (1921), Freud explica que há uma tendência no ser humano em rebaixar a inteligência e se juntar às massas. Isso faz as pessoas viverem muito mais na identificação – no mesmo, no narcisismo - do que na irreverência, na diferença e singularidade. Como é difícil para o ser humano ‘sair da caixa’. Ver por outro ângulo, criar, sair da mesmice. O que é compactuado pela sociedade toma um efeito em cadeia e em pouco tempo, todos estão pensando igual.

A vendedora de Avon rompeu as barreiras e limites sociais e trouxe Edward para casa. No que foi muito bem aceito pelo marido e filho. A fofoca a respeito do novo visitante logo se espalhou e as vizinhas se convidaram para fazer um churrasco e conhece-lo.



O que poderia ser uma aberração: suas mãos de tesoura – passou a ser um grande diferencial para a sociedade. Edward passou a podar os arbustos de forma criativa, tosar o pelo dos bichanos na redondeza e fazer cortes de cabelos altamente modernos.

Um saber-fazer com sua diferença sem precedentes! O moderno Frankenstein - havia sido criado por um senhor que o fabricou e lhe deu a vida – era sensível, criativo, gentil e empreendedor. Tinha até visão de negócio de como cortar os cabelos e vender os produtos de sua atual landlady.

Mas, Tim Burton, sempre crítico com a sociedade, denuncia: onde estão as verdadeiras aberrações? Onde está o que estraga a sociedade? O diferente ou aquele que vê a diferença e acusa o outro de não estar integrado na sociedade?

O filme á altamente atual! O quanto a sociedade está tentando negar e apagar as diferenças com técnicas e remédios que deixe toda a sociedade apaziguada, inerte, igual, narcísica. E assim, os diferentes – todos - precisam se recolher, se restringir, sem poder utilizar seu diferencial porque temos de ser uma massa padronizada e unificada. E ninguém entende de onde vem tanta ansiedade e depressão.

 

Por: Fabiana Ratti – psicanalista