O Gambito da Rainha foi uma das séries mais assistidas do
ano de 2020!
Baseada no romance de Waltes Teves de 1983, se passa na década
de 1950 e 1960 e permite várias idades assistirem. Foi possível ver em família
o que ajudou muito a ultrapassar algumas horas de pandemia a qual estávamos confinados.
Os personagens trabalham muito bem, em especial a protagonista Anya Taylor-Joy,
como Beth.
Entre tantas críticas interessantes, o ponto que posso
ressaltar aqui é que existe um potencial psicológico na série que permite ‘comprovar
o estudo de Freud’ e ao mesmo tempo enfatizar os estudos posteriores à década
de 1970 de Lacan.
A série começa com um drama psicológico entre mãe alcóolatra,
possessiva e descompensada. Um pai que não conseguiu barrar os impulsos da mãe,
e então a tragédia se deu. Beth ficou órfã e foi para um orfanato. Nesse local,
com um embotamento afetivo e compensatoriamente muita inteligência, Beth
dedica-se a jogar xadrez com o zelador. Vai evoluindo, se destacando, vai a
clubes, começa a ser conhecida. Então, Beth é adotada e sua vida muda. A mãe
adotiva, com o tempo, passa a investir em sua carreira, percebendo os ganhos
que teria com isso.
O primeiro ponto do nosso debate é que se trata de uma
questão bastante freudiana. Um romance familiar bem fraturado, uma infância
com inseguranças e medos, a falta de afeto e suporte, gera uma criança e adolescente
pouco afetiva e muito racional. Além disso, Beth, desde menina, no orfanato,
percebeu que remédios e álcool poderiam levar a uma entorpecência que a livrava
da ‘realidade’ e dava uma segurança a mais que não tinha de ‘cara limpa’, dessa
maneira entra no mundo dos vícios.
Então a série segue com originalidade num meio que é bastante masculino e Beth vai ganhando
credibilidade e apoio, cavando seu espaço dando exemplo e mostrando a que veio!
Sem entrar em detalhes e tentando não revelar mais do que
deveria da obra, num determinado momento há uma bifurcação, como na vida da
maioria dos seres humanos: o desejo ou o sintoma? E Beth é magistral em sua
escolha! Apontando a direção da última clínica de Lacan. O Sintoma ou o
Sinthome? O sintoma ou o desejo, o projeto, a realização da natureza e
subjetividade humana?
A posição lacaniana muda de patamar, pois aposta sobretudo na
escolha e decisão do sujeito, no ponto de vista como o sujeito pensa e conta
sua história, indo para além da vitimização e situação sem saída dependendo de
seu nascimento.
Beth sucumbiu ao gozo
do desejo, ao usufruto de sua natureza enxadrista! Um exemplo a todos nós!
Fabiana Ratti, psicanalista lacaniana
Nenhum comentário:
Postar um comentário