Um Reino Unido (2016) é um belo filme
inglês que mostra a força de uma boa política. Baseado em
fatos reais é dirigido
por Amma Asante e estrelado por David Oyelowo e Rosamund Pike. O filme condensa
alguns temas polêmicos, entre eles, o racismo. Seretse Khama, o príncipe de uma
província Africana, no final da 2ª Guerra Mudial, precisa voltar para o seu Reino
e assumir o trono. Porém, ao ir estudar direito na Inglaterra se apaixona por
uma jovem inglesa loira e decide se casar à revelia de sua família.
Seretse Khama decide lutar por
seu amor, enfrentar a família e conquistar o respeito de seu povo. Não é uma
tarefa fácil! Ao chegar com a esposa branca, a família e a aldeia voltam-se
contra ele. Mas, como é bonito o exercício da retórica! Como, com a palavra é
possível articular povos, mover uma nação, construir ou destruir uma realidade!
Para a psicanálise, A Verdade em
si não existe. O que existe é a versão que fazemos da realidade. A construção
que damos para ela. Seretse Khama interroga frente a seu povo: Por que
precisamos perpetuar a ideia de que brancos e negros não podem conviver? (Por
que vamos perpetuar esta verdade?) Se nós não aceitamos aqui, como vamos
reclamar que não nos aceitam lá fora? Então interroga: Como vou escolher entre o
meu amor e o meu povo? Por que preciso ficar amputado de um dos dois? Como vou
governar sem meu amor ou como vou viver meu amor sem meu povo?
Com essas palavras, Seretse Khama
toca o coração de seu povo e vai construindo uma nova realidade em seu Reino. A
palavra, para a psicanálise, é como um bisturi. É possível fazer uma grande
cirurgia psíquica, o sujeito consegue sair de posições subjetivas de depressão
e de destruição através do exercício da palavra, da fala e da escuta. É possível
fazer grandes transformações humanas com o uso da palavra. Esta é a diferença entre
a guerra e a política, entre a luta armada e a diplomacia.
No decorrer do filme. Novos
desafios vão surgindo, inclusive ‘armações’ políticas que podem prejudica-lo,
destruir seu reinado e a estabilidade em seu relacionamento. Mas, Seretse Khama
consegue ser um exímio político. Consegue suportar a impotência com paciência,
sem agir por impulso; consegue raciocinar, articular, fazer contatos, e o mais
interessante, consegue fazer um fio que liga todos as suas questões e com um
ato político, resolver todos os pontos pendentes. Magistral! Para poucos.
É muito comum, como sabemos, a
pessoa usar a política para proveito próprio, para o roubo e a destruição. O
ser humano tem um potencial enorme para a destruição. Para agir narcisicamente, via ego, para agir por impulso,
e assim, destruir.
É muito bom ver que frente a uma
decisão entre destruir e abandonar tudo, o sujeito consegue, ao contrário, pagar
o preço e lutar pela construção, pela sociedade, pela união dos povos, pelo fim
do racismo. Se as pessoas conseguissem, assim como Seretse Khama, abrir mais
mão do ego em prol de projetos via sujeito que tenha mais retorno para toda a
sociedade, o mundo, com certeza, seria melhor para todos!
Por: Fabiana Ratti, psicanalista