Por: Fabiana Ratti, psicanalista
Que filme lindo esse! Mãos Talentosas (2009) narra a biografia de Benjamin Solomon Carson
médico neurocirurgião estadunidense. Dirigido por Thomas Carter e estrelado por
Cuba Gooding e Kimberly Elisa.
Como psicanalista, penso que o ponto nevrálgico
do filme para a psicanálise é o que Lacan nomeia como a importância do “olhar
da mãe” para seus filhos.
Carson era uma criança negra, pobre, gordinha,
que ficava assistindo TV e ia mal na escola. Sua mãe trabalhava em lares de
família, separada e analfabeta. Esforçava-se ao máximo para dar o melhor aos
filhos e não revelava a eles sua parca educação formal.
Carson começou a ir muito mal na escola. Tirava
notas zero e era ridicularizado entre os amigos. Sua mãe, em nenhum momento
questionou sua inteligência e capacidade. Ela apostou no sujeito que ali
existia. Ela apostou em sua inteligência, em seu desejo de querer aprender e
crescer.
É muito bonita a cena em que Carson vai à
cerimônia religiosa e começa a brotar nele a capacidade de imaginar e de
confeccionar estórias. Ao ver o filme, nos é transmitida a ideia de que é um
universo muito pobre cultural e intelectualmente. Apenas programas bobos de
humor, nenhum livro ou conversa mais profunda. Nem isso inibe a mãe. Mesmo ela
passando por questões e problemas emocionais, ela consegue apostar nos filhos. E
nasce em Carson essa vontade de imaginar e de criar.
Outra cena bem bacana é a que ela desliga a TV
e coloca algumas leis na casa. A partir daquele dia os filhos deveriam ir à biblioteca
e fazer relatórios dos livros lidos semanalmente. Ela instaura a lei, faz a
função paterna. Não vale qualquer coisa. Falar besteiras e assistir bobagens é
bem diferente de ler, aprender e se esforçar!
O filme narra a guinada que o filho dá na escola
e na vida. Mostra as dificuldades que passa em razão do racismo, da
adolescência e da competição no mercado de trabalho, logicamente numa outra
perspectiva após essa guinada.
O chamado fracasso escolar trás para muitas
mães um golpe narcísico. Pela psicanálise sabemos o quanto é difícil e
trabalhoso fazer a separação mãe-filho. Se um filho é elogiado uma mãe
automaticamente fica com o ego inflado. Quando o filho é questionado, uma dor
narcísica preenche o coração da mãe e fica bem complicado para os pais verem
aquele sintoma escolar como um enigma, um sinal de alerta, uma cifra a ser
decifrada. Algo que fala do sujeito, algo que não está indo bem para o sujeito.
Assim, muitos hoje em dia, veem tentando tapar esse enigma com diagnósticos
prontos, remédios fortes e a exclusão do sujeito.
A mãe de Carson conseguiu uma proeza! Em sua
simplicidade, ela conseguiu separar-se de seu filho. Conseguiu ver o sujeito.
Separado dela. Diferente dela. Sem dores narcísicas pôde dizer simplesmente,
estude, faça a sua parte, você é capaz. Como diz Freud, desvencilhada do
narcisismo das pequenas diferenças, sem rivalizar, sem pensar no que ela era
capaz, apostou: estude e conseguirá.
Entre tantas cenas maravilhosas temos a última
em que Carson consegue, como médico neurocirurgião, com seu talento e empenho,
realizar uma outra proeza! Parabéns família Carson vocês trazem um legado para
a medicina, assim como para a educação. Crianças, estudem! A vida fica bem mais
colorida!